sábado, 26 de fevereiro de 2011

Organização da Escola do Campo e a Multissérie

Até onde temos ou não temos uma escola instituída ou arremedo de escola, uma cópia desfigurada de escola no campo.
Ressaltar não só o que há de negativo, o que há de confuso ou o que há de indefinido, mas se é possível construir outra organização da escola, que organização da escola?
O modelo a seguir será a organização seriada das escolas da cidade? Superar a reação tão freqüente contra as escolas multisseriadas. As escolas do campo não são multisseriadas. São multiidades. Que é diferente! Os educandos estão em múltiplas idades. Múltiplas temporalidades. Temporalidades éticas, cognitivas, culturais, identitárias. É com diversidade de temporalidades que trabalha a escola do campo. Não é com séries.
Eu estudei numa dessas escolas e nunca ouvi de nenhum professor que ele trabalhasse numa escola multisseriada. Ele falava: eu sou professor dos pequenos, o outro professor é dos maiores. Os pequenos éramos de seis a dez. A infância que penetrava ainda na educação fundamental. E os maiores eram os adolescentes, de dez a 14 anos. Na realidade era uma escola da infância e uma escola da adolescência. E uma escola da infância de seis, sete, oito e nove anos onde o professor tinha que saber lidar com multiidades, e com o que havia de comum com todas essas idades: sermos crianças ainda! E possivelmente, o que facilitava o trabalho era não perder de vista que todos estávamos no mesmo tempo humano. O tempo da infância. Enquanto que o outro professor para o qual passávamos com dez anos já tinha que partir de outra idéia. Não só que tinha de dez, 11, 12, 13, 14 anos, mas que educava adolescentes com uma configuração da adolescência no campo diferente da infância. Isto é muito mais rico do que a multisserialidade.
Classificar a escola do campo como multisseriada leva a uma visão sempre negativa e a tendência dos professores a organizar a escola por séries apesar de terem idades tão diferentes. Leva a recortar os conhecimentos: “agora trabalho o conteúdo da primeira série, agora com vocês o da segunda…” Isso é um caos!
Vamos acertar com uma organização da escola do campo que não seja cópia da escola seriada da cidade que queremos já destruir? Eu sou um grande defensor que esta escola seriada seja desconstruída e que se organize a partir das temporalidades humanas.
Temos que pesquisar mais as formas possíveis de organização da escola no campo.

Trecho extraído do artigo de Miguel Arroyo: A escola do campo e a pesquisa do campo: metas. IN: MOLINA, Mônica Castagna. (Org.). Educação do Campo e Pesquisa: questões para reflexão. – Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2006.

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